Estou naquela fase belíssima da vida em que já tenho um passado, deixei pegadas.
Não me detenho perante a aventura da vida como uma miúda, sem saber o que escolher em frente da montra da confeitaria apreciando as formas coloridas e caprichosas que se dirigem simultaneamente a vários sentidos ( a composição do extraordinário prazer de comer passa pelas sensações do paladar , pela visão, pelo cheiro e pelos pequenos rumores familiares à hora da refeição ). Conquistei a serenidade de saber exactamente o que quero e nem espreitar pela frecha do olho o que não quero.
Quando fiz quarenta anos decidi não deixar por fazer nada do que tenha vontade. Aprender surf já sendo avó ? Porque não ? Usar biquíni e estar de bem com o meu corpo e as suas imperfeições. Continuo indócil com joelhos esfolados pelas silvas das quedas nas aterragens, a minha condição é da arte do voo, seja com a asa, nas páginas de um livro ou num país exótico.
Dá-me prazer nesta fase reencontrar amizades perdidas lá atrás no tempo e falar da vida, de aprendizagens, de cicatrizes, das conquistas, da lucidez e da paixão.
Continuo a acreditar na força plena do Amor ( em sentido lato) e que a Lena que procuro está à minha espera mais à frente no caminho, basta correr a abraçá-la.
Bate-me um coração doente, mas enquanto bater será selvagem. Que vive e não sobrevive. E que agradece as pequenas graças e os deslumbramentos diários.