O adiamento das eleições gerais na Guiné-Bissau é um libelo contra uma forma de pensar a Guiné, representada por um leque de instituições internacionais que se estende da CEDEAO à CPLP, passando pela ONU.
“Será impossível organizar as eleições gerais na Guiné-Bissau, inicialmente previstas para Maio de 2013” no final do período de transição aberto pelo Golpe de Estado de 2012. As declarações do presidente de transição, Serifo Nhamadjo, feitas este domingo e só hoje divulgadas, só surpreendem a quem ande muito distraído. Este adiamento é uma ironia refinada: a “transição” deixa de ser “transitória” e assume-se como “permanente”. Pelo menos até ao próximo golpe de Estado, pois não há bem mais volátil na Guiné do que o poder.
Se é verdade que faltam, segundo a Comissão Nacional de Eleições, 30 milhões de euros para organizar as mesmas, um recenseamento biométrico da população e escasseia apoio da comunidade internacional, cansada de pagar os desvarios guineenses, também é verdade que nunca houve uma verdadeira intenção de quem verdadeiramente detém o poder no país, de entregar a “coisa política”, as rédeas do Estado, aos representantes eleitos. Aliás, a assinatura recente pelo PAIGC, minado por guerras intestinas, do “Acordo de Transição” põe à mostra as entranhas nada gloriosas dos jogos de poder guineenses.
Se ainda persistiam dúvidas sobre quem detém o Estado guineense como refém, elas esfumaram-se, como se esfumou a doce pretensão que os guineenses conseguem resolver os seus problemas sozinhos. Não, não conseguem. Será que ninguém se incomoda com o facto de até hoje nenhum presidente da Guiné-Bissau ter completado o seu mandato constitucional de 5 anos? E em 9 anos, 3 chefes de Estado Maior terem sido assassinados? Os motivos exactos dos assassinatos de Março de 2009 – Nino e Tagmé – e de Junho de 2009- Baciro Dabó e Hélder Proença – e os respectivos culpados continuam por identificar, o que reflecte a incapacidade do sistema judicial e a impunidade generalizada que grassa na Guiné-Bissau.
E assim encenado eleições como ferramenta da construção de uma normalidade democrática que existe apenas na forma, se vai adiando um país. Na tragicomédia guineense as marionetes mexem-se e os barões colombianos puxam os cordelinhos.
Eu repito-me no assunto. Revoltar-se filosoficamente contra o status quo na Guiné-Bissau já não serve de nada. Para quando um contigente da ONU estacionado no país? E uma verdadeira reforma do sector de segurança e defesa? Quando o país se tornar numa Libéria? Não quero ser Cassandra.
* Para as calendas gregas?